Assinalam-se este ano dezassete séculos do primeiro concílio ecuménico, reunido em Niceia (Iznik, na Turquia) no ano 325. A efeméride é relevante na medida em que representa uma primeira tentativa de reunir consenso. Ainda que essa procura não tenha sido inteiramente bem-sucedida na pacificação das várias facções eclesiais, o atribulado século IV viu surgir, a partir de Niceia, uma reflexão cristológica reconhecida – ainda que paulatinamente – como normativa.
A tensão então vivida deveu-se, em grande parte, às disputas teológicas relativas à natureza de Cristo: a sua humanidade e divindade. Depois de 1700 anos, embora a questão não assuma os mesmos contornos, o paradoxo de a mesma pessoa ser totalmente diferente do homem e, simultaneamente, em tudo igual ao homem, exceto no pecado, continua a interrogar uma fé em busca da compreensão e a desafiar a razão a superar os seus limites.
As I Jornadas da Associação Bíblica Portuguesa têm com título e tema “Jesus, Filho de Deus. Verdade ou Blasfémia?” e debruçam-se sobre a figura do misterioso homem de Nazaré. Em diálogo, a escritora Lídia Jorge e D. Alexandre Palma, bispo auxiliar de Lisboa, dão o mote para a discussão com um painel intitulado “Do Nazareno ao Niceno”. No sábado, quatro especialistas em Bíblia abordam a questão da identidade messiânica de Jesus, explorando as raízes judaicas do messianismo e os alvores da reflexão cristológica no corpus do Novo Testamento.
Imagem: a partir do original Jesus salva São Pedro das águas (c. 1411), de Lluís Borrassà.
Programa
Sex 7 nov — entrada livre (presencial e online através deste link)
19h00 às 20h30
Conversa entre Lídia Jorge e D. Alexandre Palma, moderada pelo jornalista Henrique Monteiro
Do Nazareno ao Niceno
Sáb 8 nov — inscrição obrigatória (presencial e online: compra no final da página)
10h15 às 11h30 com P. Francisco Martins SJ
Blasfémia para os judeus? Sim… e não
Que género de Messias esperavam os judeus do tempo de Jesus? Um Messias político? Um salvador humano? O estudo da literatura judaica do chamado período intertestamentário revela a enorme diversidade de expectativas messiânicas então reinante e abre a porta à compreensão das raízes judaicas da fé na divindade do Messias Jesus.
12h00 às 13h15 com P. César Silva SVD
No princípio, era a Cristologia: os hinos pré-paulinos e a filiação divina de Jesus
Os mais antigos escritos do Novo Testamento, as cartas de Paulo, incorporam formulações e hinos oriundos das primeiras comunidades cristãs. Estes textos, que são vestígio do primitivo culto cristão, apresentam a codificação de postulados cristológicos que proclamam de forma inusitada a divindade de Jesus. Sugerem, por isso, que as comunidades ainda em formação não hesitaram em reconhecer Jesus, o Messias de Israel, como Filho e Senhor.
14h45 às 16h00 com P. João Alberto Correia
O Jesus sinótico: da pessoa única à visão plural
Os evangelhos sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas) apresentam um retrato multifacetado de Jesus, enfatizando a sua humanidade, a sua missão messiânica e a sua relação singular com Deus. Plenamente humano, Jesus aparece investido de poder para perdoar os pecados, interpretar a Lei, realizar milagres e ensinar com autoridade divina, revelando progressivamente a sua identidade e missão salvífica. Trata-se de uma cristologia progressiva que suscita a fé frágil dos discípulos, provoca a confissão messiânica de Pedro e revela a identidade plena de Jesus, na sua paixão, morte e ressurreição.
16h30 às 17h45 com P. Mário Sousa
Um Cristo sem fraturas: a construção de Jesus no Evangelho de João
As comunidades para as quais é escrito o Evangelho de João têm uma realidade complexa, quer a nível interno (com membros vindos do judaísmo e do paganismo, com culturas e contextos sócio-religiosos diferentes e até antagónicos), quer a nível externo (conflitos crescentes com as comunidades judaicas e as autoridades do império). A situação interna inspira visões cristológicas diferentes, que se espelham na unidade da comunidade, posta em perigo também pelas dificuldades com o ambiente religioso e político exterior.
Biografias
P. Francisco Martins SJ nasceu em 1983 e é jesuíta desde 2005. Foi ordenado sacerdote em 2015. É doutorado em Bíblia pela Universidade Hebraica de Jerusalém (Israel). Atualmente é professor no Pontifício Instituto Bíblico em Roma (Itália) e vice-presidente da Associação Bíblica Portuguesa.
P. César Silva SVD nasceu em Braga em 1987 e é membro da Congregação do Verbo Divino. Licenciou-se no Pontifício Instituto Bíblico e atualmente faz doutoramento sobre as Cartas de São Paulo na Universidade Gregoriana. É professor de Escritos Paulinos, Evangelhos Sinóticos, Atos dos Apóstolos e Epístolas na Universidade Católica Portuguesa (Lisboa).
P. João Alberto Sousa Correia é sacerdote da Arquidiocese de Braga. É pároco de Santa Maria de Prado (Vila Verde). Licenciado em Teologia pela Universidade Católica Portuguesa, especializou-se em Ciências Bíblicas no Pontifício Instituto Bíblico, em Roma. Doutorado em Teologia Bíblica, é atualmente Professor Auxiliar da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa.
P. Mário Sousa nasceu em Vila Real de S. António (1971) e é sacerdote da Diocese do Algarve. É pároco da Matriz de Portimão, Vigário Episcopal para o Barlavento e Presidente do Cabido da Sé de Faro. Em Roma, licenciou-se em Bíblia no Pontifício Instituto Bíblico e doutorou-se na Universidade Gregoriana. É professor no Instituto Superior de Teologia de Évora, presidente da Associação Bíblica Portuguesa e preside à Comissão da tradução da Bíblia da Conferência Episcopal.
Estas Jornadas são uma parceria da Associação Bíblica Portuguesa com a Brotéria.
